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segunda-feira, 5 de outubro de 2009

CULTURA | O que dizer agora?

ANELITO DE OLIVEIRA - A poesia e a política sempre foram, para mim, duas possibilidades extremas de ação, uma conectada ao "eu" e outra ao "mundo". Nenhuma das duas jamais chegou a ser um absoluto, algo bastante, são dimensões relativas. Ao me ater ao eu nunca quis falar de algo apenas interior, tampouco quis falar de algo apenas exterior ao me ater ao mundo. Daí que, embora situadas nos extremos da havência, no rastro do "Il y a" lévinasiano: da situação de estar havendo no mundo, poesia e política nunca foram incompossíveis - para mim, somente.
A questão é que a ação poética e a ação política nunca foram, também, apenas o que eram ou são ainda para mim, algo com sentido suficiente em mim mesmo. Quando me encontro com uma e outra possibilidades de dizer-fazer, um jogo já está definido em termos de verdade (poesia) e mentira (política), poesia e política já estavam definidas como extremidades incompossíveis. Poesia e política não eram apenas, feliz e infelizmente, o que eu sentia ou o que eu pensava, eram menos, eram mais. Poderia renunciar às duas, quimeras dos antigos, leviataneidades - sim, eu poderia.
Mas se a poesia fosse apenas o que eu sentia, seria algo circunscrito a uma pessoa, a um ego. E se a política fosse apenas o que eu pensava, seria algo igualmente circunscrito a uma pessoa, a um ego, também. Nego. Nego tanto que cheguei a tentar dizer esta negação tantas vezes, como num poema chamado "eu", aparecido no Suplemento Literário de Minas Gerais de junho de 99: "sei que digo, e o que digo sou eu/ para além do nome". Há o outro na poesia, não como objeto, mas, sobretudo, como sujeito, ou, no limite, como o "subjetile" de Artaud tensionado por Derrida, um terceiro.
É possível banir o outro, e nesse banimento - tão constante na poesia hegemônica no país hoje - revela-se a produtividade de a política não ser o que eu pensava, ou ainda pense ser. O outro é banido por um excesso de racionalização, que culmina sempre em tirania da razão, numa anulação da política, portanto. A política é também o que eu sinto, assim como a poesia é também o que eu penso - também, não só, porque os outros contam. A bem do outro, é preciso sentir e pensar com agudeza, distinguindo poesia de poesia em poetas, e política de política em políticos. Lula chorando no Rio, o Psiu Poético berrando no sertão.

3 comentários:

  1. Anelito: vc fica com Lévinas, Derrida, filosofices, mas afinal, quem, fora vc mesmo (que jamais se consagrará poeta se não morar no Rio de Janeiro ou em São Paulo), vc reconhece como poeta importante no cenário contemporâneo.

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  2. falo até pouco de lévinas, derrida. devia falar mais. e falo pouco justamente porque não gosto de "filosofices". são filósofos? a filosofia teria acabado em hegel - que também prezo muito como não-filósofo. o argelino derrida e o lituano lévinas, estrangeiros na cultura francesa, ocidentalóide em geral. também me sinto, claro, estrangeiro - na literatura, inclusive -, o que não é novidade em relação a quem escreve. mas, enfim, nunca pensei em consagração, nem dos outros, nem minha. eu mesmo? tenho estado na flip? ganhado prêmios? e - o mínimo - tenho sido publicado por alguma editora daquele eixo? nunca tive nem tenho certeza sobre a exterioridade do escrever, sobre a vida literária - vivo, certamente, a morte do autor.

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  3. Curioso, isso é verdade mesmo, vc vive isso!

    E o Deleuze, vc não fala mais nele...que onda foi ele na nossa época de graduação. Aqui na web tive oportunidade de ter contato com o Gerald Thomas e com o Caetano Veloso, de quem muito se falava no nosso tempo de graduação, não é? Eles vivem loucamente o AUTOR.

    Foi legal, mas um pouco decepcionante. Achei muito satisfeitos consigo próprios. Ao estreitar contato com eles, percebi: são de outra geração, são meu tio, meu pai...
    Outro dia João Evangelista esteve aqui em Bom Despacho. Ele curiosamente, num lapso, citou vc como sendo um poeta da geração dele. Logo ele mesmo se corrigiu. João é talentoso, mas...digamos, para ele, o AUTOR não morreu e ele é o homem dos sete talentos, mais do que o Mário de Andrade. Não sei se vc sabe, mas ele ficou muitíssimo chateado comigo quando vc escreveu um prefácio para ele e ele, como vc o chamava poeta da falação junto com o Dolabela, me pediu para escrever outro, obviamente mais favorável. Eu me neguei e ele me deu o maior gelo no lançamento do livro; nem conversou comigo. E eu o fiz por coleguismo, por respeito a vc.

    Abraços do Lúcio Jr.

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